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quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Clamando pela Morte (Conto de minha autoria)

Saudações, imortais!

Faz já algum tempo que não escrevo um novo conto para postar aqui no blog. Estava ocupado, principalmente com o livro, que muito em breve, trarei ótimas novidades!

Apesar de atarefado, a ânsia de escrever foi maior, e criei um novo conto, intitulado Clamando pela Morte. Este conto que estou postando.

Espero que gostem, e comentem ao final da postagem.

Sangue que escorre de um corpo sem vida. Sangue escarlate que mancha a escuridão fria.



Autoria: Kampos

Pequenos estalos surgiam conforme pisavam nos galhos. O vento soprava entre as folhas, alertando quanto ao frio que viria. O céu avermelhado logo daria lugar ao véu negro de mais uma noite. Os quatro caminhavam, cada um com uma enorme mochila nas costas, e por alguns momentos, quebrando o silêncio:

- Nossa, mas vamos andar até que dia?!

- Já estamos quase no local, André. Fique tranquilo.

- Tranquilo... Com esses mosquitos me atacando. Que ideia essa, viu!

- Porra, se ele continuar a reclamar vou descer a mão nele!

- Calma, Júlio. Precisamos ter paciência com o André. – Mateus disse discretamente, dando um tapinha em seguida no ombro de Júlio.

- Ele tá reclamando desde quando saímos lá do centro da cidade! – Completou Júlio.

- Eu sei... Eu sei! – Complementou Mateus, em seguida.

Mateus buscava não se incomodar com as reclamações de André, e ao mesmo tempo, controlar o temperamento de Júlio. A única que permanecia quieta, sem expor suas opiniões era Sara, namorada de André.

A caminhada entre as árvores, em meio à floresta, tinha um propósito maior do que apenas um passeio. Buscavam a paz, o equilíbrio para contornar uma situação extremamente difícil. André ainda sustentava em seus pulsos as marcas de sua recente tentativa frustrada de suicídio. Para tristeza do grupo, as marcas não representavam apenas uma tentativa de acabar com a própria vida, mas sim, a terceira. André estava desmotivado, depressivo, com ódio e sem ânimo de viver. Com medo que o pior acontecesse em uma nova tentativa de suicídio, seus melhores amigos, Mateus, de vinte oito anos, o mais velho do grupo, que já apresentava alguns fios de cabelos brancos, e Júlio, o bombado e esquentadinho, que adorava uma praia para fazer graça para as garotas enquanto surfava, decidiram se unir mais ao amigo e tirá-lo da correria da cidade grande. Logicamente, junto a eles, estava a bela Sara, garota nova, cabelos longos, de olhar ingênuo e de corpo atrativo. O namoro quase não mais existia. André, de cabelos desarrumados, roupas amassadas e olhar vazio, estava diferente, vivia em seu próprio mundo, e renunciara totalmente a vontade de continuar entre os vivos. Quando abria a boca era apenas para reclamar. A louca paixão que um dia apresentara por Sara, parecia não existir mais. Ele não demonstrava afeto, apenas indiferença, e isso fazia com que a garota sofresse mais ainda. De longe deixara de ser o brincalhão da turma de antigamente.

Esse passeio mais era uma fuga de tudo, e não havia planejamento. Apenas viram em meio a floresta a chance de tentar reverter a triste situação. Só não imaginavam que estavam indo de encontro a um destino sombrio.

Despertou assim que o Sol partiu. A Lua o chamava. Parecia cantar para ele. Sorriu, ainda deitado. Levantou-se, animado. Não demorou em sentir a presença de sangue quente. Que bela surpresa ao acordar. Ajeitou sua roupa negra, colocou o sobretudo e saiu do covil macabro. Na escuridão, apenas era possível ver um par de olhos que queimavam de fúria e desejo de matar. Nesta noite não precisaria ir longe para acabar com sua sede. Sentiu o aroma no ar. Como um vulto, se locomoveu.

A caça começou.

Já com as barracas armadas e depois de muitas reclamações de André, o grupo encontrava-se sentado em volta de uma pequena fogueira. O frio da noite fazia com que todos ficassem encolhidos, a maioria abraçando as próprias pernas, buscando esquentar seus corpos um pouco mais. Apesar de anos de amizades, pareciam estranhos sentados um ao lado do outro. Um clima pesado rolava entre eles. Tirando André, os outros procuravam uma forma de iniciar uma conversa. Tinham medo de piorarem a situação. Bastou um desabafo para quebrar o silêncio.

- Chega! Não aguento mais isso! – Declarou Sara, começando a chorar.

André apenas olhou, sem demonstrar menor sentimento pela cena. Voltando logo a olhar para as formas que as chamas criavam na fogueira. Este foi o ponto final para a paciência de Júlio que se levantou, bravo:

- Porra, André! Você não está vendo?! Olha como a sua namorada está! Olha como estamos! Até quando vai isso?! – Júlio gesticulava freneticamente, enquanto desabafava em alto tom.

- Senta, Júlio. Senta. – Mateus, mais uma vez, buscava acalmar os ânimos, porém sem sucesso.

- Que sentar! Eu não quero sentar! Eu quero que esse pesadelo acabe! Somos obrigados a ver um amigo nosso, praticamente um irmão, querendo tirar a própria vida! Por que isso?! Por quê?!

André permanecia em silêncio. Nem parecia que ele era o tópico da conversa.

Sara só conseguiu dizer, em meio às lágrimas:

- Volta a ser aquele André! O “meu” André... Por favor!

Enquanto o choro rolava lá embaixo, e os nervos estavam à flor da pele, no alto de uma árvore, ele observava tudo. Sua audição aguçada permitia-o escutar cada palavra. Foi fácil localizá-los, não somente pelo cheiro de sangue fresco, mas também pelo negativismo que havia ali. Isso era como um ímã para a criatura, que mesmo antes de provar do sangue daquelas pessoas já se alimentava pela dor psicológica que os meros mortais sentiam no momento. Aguardava, sem pressa, para atacar. Estava saboreando o desenrolar da história.

André permanecia indiferente, nada o comovia, nem mesmo o choro da namorada ou o apelo dos amigos. Júlio, percebendo que apenas palavras não adiantariam, partiu para cima de André, para a surpresa de todos. Tanto Júlio quanto André rolaram pelo chão. Júlio ficou por cima e agarrou a camiseta do amigo, chacoalhando-o enquanto argumentava em berros:

- ACORDA, ANDRÉ! ACORDA! PARÁ COM ESSAS IDEIAS DE SE MATAR! CHEGA! EU SEI QUE FOI DURO A PERDA DE SEUS PAIS E SEU IRMÃO NO ACIDENTE, MAS VOCÊ DEVE SUPERAR E NÃO SE ENTREGAR!

Mateus correu em direção a Júlio, tentando impedi-lo de machucar André.

- Pare com isso Júlio!

Sara estava em pé ao lado, chorando, desesperada.

Em meio a toda confusão, finalmente André falou:

- ME DEIXA EM PAZ! EU NÃO QUERO MAIS VIVER! NÃO TENHO MAIS PORQUE VIVER! PERDI TODOS! ME DEIXA! EU QUERO A MORTE!

Júlio, Mateus e Sara ficaram estáticos. Pela primeira vez ouviram André declarando o desejo de morte. Ficaram sem ação e perceberam que não adiantaria o que fizessem, André não mudaria de ideia.

Escorrendo uma lágrima, André afirmou mais uma vez:

- Eu não quero mais viver. Quero morrer... Eu quero... eu quero... A MORTE.

E neste momento, algo saltou das árvores, chamando a atenção do grupo.

- Você me chamou... Estou aqui! – Caminhando com calma, a criatura de negro se aproximou da fogueira, revelando seu semblante pálido.

Sara, assustada e sem entender, perguntou:

- Que-quem é você?

- Quem sou eu? Sou um sugador de vidas, um vampiro, sou aquele que seu amigo tanto clama pela presença... Eu sou a MORTE. – O vampiro sorriu, deixando visível seu temível cartão de visitas, suas longas presas.

Sara entrou em choque, e começou a berrar. Mateus ficou a olhar o cidadão de sobretudo preto e estatura mediana, enquanto Júlio soltou André, colocando-se ereto, de frente para a estranha figura.

- Olha cidadão! A situação aqui já está tensa o suficiente para aguentarmos um mané de dentes defeituosos! Cai fora! – Júlio estufou o peito, na tentativa de intimidar o estranho com seus músculos.

- Eu estou aqui para resolver o pequeno impasse de vocês. – O vampiro sorria de forma maliciosa, não demonstrando mínima intimidação pela presença de Júlio.

- VAI A MERDA, CARA! – Júlio não perdeu tempo e partiu para cima. Armando um soco com a mão direita, Júlio aproximou-se do vampiro que permanecia parado. O rapaz não hesitou e desferiu o golpe mirando o rosto do adversário de pele pálida. Porém o golpe não o atingiu, simplesmente o punho de Júlio rasgou o ar, desequilibrando-o, fazendo com que caísse ao chão.

Mateus não acredita no que viu. Ele tinha certeza que Júlio acertaria o oponente, mas do nada o cara simplesmente sumiu, como se evaporasse no ar.

- O que aconteceu?! – Júlio perguntou, ainda agachado.

- Surpreso? – A macabra voz partiu detrás de Júlio, que ficou espantado.

De repente, uma mão forte agarrou seu pescoço por trás, e com extrema facilidade, o ergueu.

- Você é fraco! Pensa que músculos de algo adiantariam contra um ser como eu?! Hahahahaha – O vampiro permanecia com Júlio preso em sua mão direita. A vítima não relava os pés no chão, e a dor no pescoço aumentava.

- LARGA ELE! – Mateus gritou, saltando contra o vampiro, que surpreendentemente o agarrou com a mão esquerda.

- TOLOS! – Berrou o vampiro com uma voz amedrontadora.

Sara permanecia em choque. Chorava e gritava, enquanto André nem mexia. Estava agachado, com olhos arregalados.

- Já brinquei com vocês, agora é hora de me alimentar. – O vampiro levou para perto de sua boca Júlio e mordeu com força suas costas, fazendo com que o rapaz, com o pouco de força que lhe restava, berrasse de dor. O vampiro fez questão de arrancar um pedaço de carne, rasgando assim também a camiseta do rapaz. O sangue jorrava e o vampiro se deleitava. Como em um banquete, ele revezou para o próximo “prato”, não soltando Júlio ainda. Mordeu o ombro de Mateus, gerando mais berros de dor e mais sangue espalhado. Mateus socou de forma desengonçada o vampiro várias vezes, mas nada adiantava. Os dois amigos berravam enquanto permaneciam em poder do agressor, que sem paciência, decidiu acabar com o barulho.

- CALEM A BOCA! – Ao mesmo tempo que ordenava, cuspindo sangue que se encontrava por toda sua boca, o vampiro levou a cabeça de um contra a do outro, com grande velocidade e força, fazendo ambas se chocarem, seguindo um estrondo, e assim, espalhando pedaços para todos os lados, espirrando sangue até em André e Sara. A garota, pronta para desmaiar, caiu ajoelhada no chão, perto de André, que permanecia como uma estátua, porém agora com gotas de sangue de seus amigos recém-mortos em sua face.

A boca do vampiro ganhara uma coloração escarlate. O sangue escorria até seu queixo. Calmamente foi em direção a Sara, que não tinha forças para correr. André acompanhava apenas com os olhos, e o vampiro permanecia a encará-lo. Lentamente o vampiro pegou a garota pelo pescoço, sem sofrer qualquer objeção. O vampiro olhava nos olhos de André, como se esperasse dele alguma reação.

- Sua namorada, não é? – Perguntou o vampiro. – Ouvi toda sua história. – Completou – A morte não é algo bonito, nem sempre é calma e satisfatória. – Enquanto falava e encarava André, o vampiro caminhava arrastando a garota pelo pescoço, em direção a fogueira. – Já morri, e contemplei o outro lado. Já matei, e vi o sofrimento nos olhos de cada vítima. Estar morto não significa estar em paz, isso te garanto. – O vampiro ergueu um pouco a moça, e foi aos poucos aproximando o rosto dela das chamas da fogueira. A garota já sentia alguns fios de cabelo se queimando.

O vampiro deu uma pausa no que dizia, como se quisesse escutar as brasas do fogo estalando, como se suplicassem pela carne.

- Já te mostrei como a morte pode vir rápida, como foi com seus amigos. Agora vou te mostrar como ela pode ser lenta e dolorosa, o que certamente atormentará a alma para o resto da eternidade. – Súbito, a criatura levou a cabeça de Sara para dentro das chamas da fogueira. A garota começou a espernear e se debater, berrando de dor. As chamas aumentaram, inclusive consumindo a mão do vampiro, que aparentava sentir prazer pela dor. O cheiro de carne queimada tomou conta do ar. A força do vampiro era tamanha, que não importava o que Sara fizesse, ela não conseguiria soltar-se da mão de seu carrasco. E a garota berrava cada vez menos, aos poucos parando de se mover, aos poucos tendo o rosto desfigurado, e aos poucos, perdendo o que lhe restava de vida. Dos olhos de André, apenas uma lágrima escorria, enquanto encarava a cena, sem mover um músculo.

Morta, o vampiro soltou o que sobrou da garota nas chamas, deixando que o fogo começasse a consumir o corpo da falecida. A mão do vampiro, praticamente apenas em ossos, parecia não incomodá-lo. Caminhando alguns passos, parando em frente ao rapaz agachado, o vampiro, com seus olhos que se assemelhavam as chamas da fogueira, perguntou:

- E então, estou aqui! O vampiro, o carrasco, a morte tão clamada por você... E agora, me diz, do fundo dessa alma atormentada, o que você quer?

Então ali, naquele momento, olhando a face da morte, diante da medonha criatura que possuía em sua boca o sangue de seus amigos e que matara sua namorada de forma tão cruel, o rapaz contemplou o que realmente significava morrer e soube o que queria. Chorando, respondeu:

- Eu quero... eu quero... VIVER.

- Patético! O medo da morte é maior que o desejo mórbido, não é? Pena para você, que só percebeu isso após seus amigos e namorada serem mortos! Hahahaha! – O vampiro virou-se e caminhou em meio às árvores como se nada tivesse acontecido, e sumindo entre as sombras, já saciado. Satisfeito pelo joguinho. Para alguns, o fato do vampiro permitir que o rapaz vivesse poderia parecer um ato piedoso, mas pelo contrário. O vampiro já estava saciado de sangue, já havia torturado a garota e para seu deleite, mesmo sem causar danos físicos em André, conseguira acabar com algo de mais importante para um mortal, a sua alma, que permaneceria eternamente atormentada pela morte de seus companheiros.

André, agachado, chorando, e agora, sozinho, finalmente percebeu que a morte não era a saída fácil, a solução, que imaginara. A morte era horrenda, triste e assustadora. Não poderia fugir do mundo, o preço era alto demais. Deveria superar sua dor. Seu corpo poderia morrer, mas sua alma permaneceria a sofrer. Infelizmente, o vampiro estava certo. Só foi possível enxergar o que seus amigos e sua amada namorada diziam tanto a ele, ao ver as suas trágicas mortes. Perdera sua segunda família. Em prantos, deitou-se no chão, encolhido, e ali ficou.

Após um dia e meio, um grupo de pessoas encontrou o acampamento. A cena era horrível e o cheiro também. Dois mortos sem cabeça e um corpo carbonizado, e ali, entre os cadáveres, apenas um sobrevivente que foi rapidamente levado para o hospital local. Quando foi indagado sobre o que aconteceu, a única coisa que o rapaz conseguia dizer era: “Eu quero viver.”.

André nunca mais foi o mesmo. Permaneceria os restos de seus dias em uma instituição mental. Sua alma estava em pedaços. A culpa era um sentimento constante. Sabia que deveria resolver seus dilemas em vida, para que, quando a morte chegasse, tivesse a chance de ir em paz. Mas apesar de tudo que acontecera, estava vivo, e tinha certeza de algo... Nunca mais clamaria pela morte.

Fim




3 comentários:

  1. Nossa Karlo, gostei muito... muitas pessoas passam pela situação de se fecharem em um mundo so seu e não pensam no quanto estao perdendo da vida!
    E para mim desejar a morte é a coisa mais egoísta que um ser humano pode querer, é um não pensar em nada e nem em ninguem a não ser em seu próprio "descanso" ...
    Mas é a velha história... pessoa burra tem que se foder....rsrsrsrsrsrs
    Parabéns pelo conto, ficou fantástico...
    Abraços amigo!

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  2. Carlos Maretti,

    A morte é apenas um refúgio para os covardes, pessoas desequilibradas desde quando nascem, pois para enfrentar a vida é preciso ter caráter, determinação, coragem, coisas que poucos têm!
    Muito bom o conto, continue assim e logo teremos um bestseller!!
    Um abraço!!!

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